quarta-feira, 20 de julho de 2011


ESTÃO QUERENDO ENGANAR QUEM ?
não somos assim tão bestas, pensam que estão nos enganando, mas não estão. Nós sabemos de tudo e não somos bobos
João Ubaldo Ribeiro

Li em algum jornal que a Fifa, essa organização da qual volta e meia se evola um odorzinho de mutreta, que lida com cachoeiras de dinheiro, cujas decisões são às vezes vistas como fruto de processos viciados e que, enfim, não é nenhuma casa pia, ameaçou fazer a Copa de 14 na Espanha, se as obras aqui não forem apressadas - ou até mesmo iniciadas, como dizem que é o caso de muitas. Por artes do caprichoso destino, isso pode interessar à Espanha, que tem estrutura e está pendurada. Pode interessar a toda a Europa, aliás, devido ao reflexo dos problemas espanhóis na economia do euro. E talvez o Brasil nem conseguisse ir aos jogos, porque os espanhóis poderiam aparelhar os aeroportos para otimizar sua já tradicional deportação de brasileiros.

Apressar as obras significa, como também se divulga muito, relaxar controles sobre custos e gastos. Claro, qualquer que seja o resultado dos debates, todo mundo sabe que haverá roubo. Se for feita uma enquete, tenho certeza de que a grande maioria dos brasileiros acredita que vai haver roubo nessas obras, com sigilo, sem sigilo, de que forma for. Existirá sempre um jeito de roubar, entendido isto como faturamento fraudulento, propinas, desvios de materiais e serviços e, enfim, todo tipo de trambique aplicável, num repertório em que seguramente somos líderes mundiais.

Sim, todo mundo está cansado de saber disso. Então para que tanta complicação inútil, se tudo vai ser mesmo garfado, sempre foi, desde que nos entendemos e ninguém tem problemas ao ganhar dinheiro desse jeito? Há tantos estádios a construir, tantos aeroportos a reformar, tantas obras públicas, tantas armações que podiam já estar rendendo grana e ficamos nessa demora ridícula, repetindo atos ou palavras que nunca resolveram nada. Tanto o que surrupiar já dando sopa aí e esse pessoal perdendo tempo em formalidades que todo mundo sabe que não servem para nada, a não ser para embalar o sono dos que as ouvirem, em forma de discursos, no Senado Federal. Não havia nem necessidade da mãozinha que a Fifa está querendo dar (ou meter).

É difícil assistir a um noticiário de televisão em que não seja mostrado o desbaratamento e prisão (e imediata soltura, em questão de segundos) de pelo menos uma quadrilha que fraudava algum órgão público. Difícil, não, impossível; não me recordo de nenhum. Se qualquer político for acusado de ladrão numa roda de conversa, dificilmente alguém o defenderá com convicção, porque confere com o padrão que nos acostumamos a aplicar à nossa sociedade. Nenhum tipo de falcatrua ou sordidez nos surpreende e é bastante comum que, nessas conversas, alguém lembre uma história bem pior.

E os parlamentares, se não são todos ladrões em sentido amplo, são beneficiários impudentes de uma abundância obscena de privilégios, a começar pelo imoralíssimo foro especial, que os põe numa acintosa classe acima dos governados, a quem não prestam satisfações e cuja vontade ignoram, se não coincide com seus interesses. Há sentido nas miríades de "ajudas", nos fantásticos seguros de saúde, nas generosíssimas viagens e em tudo mais de que desfrutam para mal e pouco trabalhar, isto quando trabalham? Os estrangeiros têm dificuldade em compreender como uma sociedade aceita esse deboche deslavado, que ainda lhe é impingido com arrogância e ostentação de poder. Não acho de todo descabida a semelhança que vejo entre esses privilégios e os da corte de Luís XIV, na França do século 18. De fato, como já disse aqui, o Estado entre nós não é o rei, que não temos; mas o Estado entre nós é dos governantes e a soberania é deles, respeitados os donos da economia.

No serviço público, a falta de compostura e o nepotismo, embora hoje disfarçado pelos intrincados laços familiares dos brasileiros, são a regra. O que é público não é de ninguém, começando pelo material de escritório levado para casa e terminando pelos cartões corporativos. Ocupantes de cargos públicos de relevância se associam secretamente a empresas de "consultoria" e assim ganham fortunas, fazendo na verdade advocacia administrativa e tráfico de influência. Egressos do serviço público caem na mesma prática, pois o serviço público aqui não é para o público, mas para quem o presta, ou alega prestar. O serviço público é uma oportunidade para "se fazer". Comportam-se assim até os menos rapineiros, que se contentam em "colocar" um filho aqui ou acolá, ou bem encaminhar seu futuro depois da política, apesar de já bastante acolchoado por aposentadorias magnânimas e benesses liberais.

E ninguém, afinal, é punido por nada. Se antes isso se aplicava somente aos ricos e poderosos, agora vale para todos. A melhor maneira de matar alguém no Brasil é ficar bêbado, pegar o carro e atropelar a vítima. Aí o atropelador se recusa a usar o bafômetro e vai para casa, responder a processo em liberdade, para, no caso difícil de vir a ser condenado, cumprir a pena também em liberdade. Embriaguez pode até virar atenuante, surto psicótico. Matar gente, aliás, é cada vez mais fácil, talvez mais que roubar. Matar bicho nem tanto, mas pega mal o sujeito sair dizendo que está sob a proteção do Ibama.

É por essas e outras que eu digo: vamos parar com essa enrolação toda, que chega a nem ficar bem, parece sabotagem com a Seleção. Não já estamos exaustos de saber que, em ocasiões semelhantes, meteram a mão na granolina para valer? Não é assim que se faz e sempre se fez neste país, como costumava lembrar um grande líder nosso? Então vamos liberar logo essa grana e sossegar a rapaziada, corrupto também fica estressado. E, afinal de contas, não somos assim tão bestas, pensam que estão nos enganando, mas não estão. Nós sabemos de tudo e não somos bobos, somos apenas omissos, submissos, cínicos e cada vez mais moralmente insensíveis - ninguém é perfeito.

Jennings descarta Copa no Catar e pede intervenção de Dilma na CBF


A seleção brasileira representa mais de 190 milhões de pessoas, mas Ricardo Teixeira acha que pode fazer o que bem entende pelo fato de a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ser uma entidade privada. Ainda assim, o jornalista escocês Andrew Jennings, famoso mundialmente por denunciar uma série de irregularidades na Fifa, pede que a presidente Dilma Roussef intervenha para destituir o mandatário e descarta a realização da Copa de 2022 no Catar.

Fernando Dantas/Gazeta PressResponsável por denunciar  irregularidades na Fifa, Andrew Jennings quer Ricardo Teixeira fora da  CBFResponsável por denunciar irregularidades na Fifa, Andrew Jennings quer Ricardo Teixeira fora da CBF




















Autor do livro "Jogo Sujo. O Mundo Secreto da Fifa: Compra de Votos e Escândalo de Ingressos", em que denuncia esquemas de corrupção e favorecimento dentro da entidade que comanda o futebol, Jennings visitou São Paulo para promover a obra e, antes de participar de um bate-papo em uma livraria na cidade, recebeu a equipe da GE.Net. "O Brasil pertence aos brasileiros e ninguém faz nada no território brasileiro sem a permissão do governo eleito e do povo", declarou.

Além de presidir a CBF, Ricardo Teixeira é o mandatário do Cômite Organizador Local (COL) e centraliza a organização da Copa do Mundo de 2014. A presença do cartola, acusado de receber cerca de R$ 16 milhões de propina de uma empresa de marketing associada à Fifa, não inibiu a entidade de pressionar os representantes das cidades-sede a fecharem contratos com seus parceiros, o que contraria o processo de licitação adotado no Brasil.

Jennings defende uma maior participação do governo federal na organização da Copa de 2014 na medida em que boa parte do dinheiro empregado no evento é público, mas condena o chamado Regime Diferenciado de Contratações, mecanismo que torna sigiloso os orçamentos previstos para as obras durante o processo de licitação. Ele ainda reprovou a escolha da Rússia como sede em 2018 e descartou a possibilidade de o Catar abrigar a edição de 2022 do campeonato: "não vai ser realizada".

Corrupção na construção dos estádios

Tenho uma forte suspeita em relação ao atraso na construção dos estádios. A indústria da construção civil é sabidamente corrupta em vários países. Ela paga para conseguir as obras e depois vai devagar, não constrói. O cliente tem um prazo e fica preocupado. Aí, os construtores falam: "se a gente colocar todo mundo para trabalhar à noite inteira e de final de semana, a obra sai, mas vai custar um dinheirinho a mais". É uma forma de chantagem da indústria da construção civil. Eu também estou muito preocupado com a relação entre o Teixeira e o Jerome Valcke [secretário-geral da Fifa]. Se eu vir mais uma vez eles se beijando e abraçando, vou vomitar. Eu não aguento mais isso e estou sentido um cheiro de chantagem. O Valcke fica lá na Suíça e, de repente, fala: "as obras estão andando devagar, vamos acelerar!". Aí, o Teixeira vai chegar e falar ao governo brasileiro: "nós precisamos de mais dinheiro". Será que o governo vai dizer: "não, a gente não precisa construir estádio, somos o país do futebol e o resto verá pela televisão"?.

Legado

É engraçado. Toda vez que homens de negócio ficam ricos por conta de uma candidatura para receber a Copa do Mundo ou os Jogos Olímpicos, nós sempre ouvimos "legado, legado, legado". Em outras palavras, eu prometo uma coisa para você, mas vai acontecer só no futuro, então me dê seu dinheiro agora e vai ser maravilhoso. Faça o que eu falo pra você fazer, que você terá um futuro maravilhoso. Legado? Que legado? Não existem evidências científicas que um grande evento no seu país faz as crianças começarem a se exercitar, praticar mais esporte. Não. Elas vão estar sentadas no sofá, vendo pela TV, por que deveriam se levantar? O que há com esses eventos esportivos que falam sobre legado saudável e são patrocinados por Mc Donalds e Coca Cola, os inimigos das crianças. Você pode pensar se há alguma hipocrisia aí.

Lobby da Fifa por parceiros próprios

A Fifa quer que o Brasil pague pela Copa do Mundo dela. Eles não podem dizer ao Brasil o que fazer, não há razão para isso. É uma dessas coisas diplomáticas: a presidente deveria mandar um representante falar com o presidente [da Fifa, Joseph] Blatter. "Eu tenho um recado da presidente: não mexa com a gente, ok?". O que eles não podem aceitar na Fifa é a presidente eleita de um país se levantando e dizendo: "a Fifa fede, eles estão tentando roubar nosso dinheiro". O Brasil pertence aos brasileiros e ninguém faz nada no território brasileiro sem a permissão do governo eleito e do povo. Então o governo, que está gastando muito dinheiro, precisa se manifestar. "Isso é o que nós queremos que aconteça na nossa Copa do Mundo, no nosso país, e estaremos bem. Receberemos os fãs, dará tudo certo, e não teremos que gastar tanto dinheiro".

Marcelo Ferrelli/Gazeta PressNa presidência da CBF desde1989, Ricardo Teixeira também é  responsável por organizar a Copa de 2014Na presidência da CBF desde1989, Ricardo Teixeira também é responsável por organizar a Copa de 2014




















Transparência x regime diferenciado de contratações


Tem algo realmente errado acontecendo com esses contratos. Não estamos falando de ciência nuclear, são contratos, podem ser monitorados. Então por que o governo não está olhando todos os contratos e os publicando na internet? Futebol é basicamente o jogo do povo, vamos deixar o povo ver os contratos, por favor! Não vejo debate público sobre o que o Brasil precisa. O que o país precisa, nós fazemos, e é isso. Aí você volta um pouco. A candidatura é comandada por construtoras buscando lucros mundiais e recompensas, mas deveria ser dirigida pelo governo e por pessoas genuinamente do futebol. Não pense que o senhor [Ricardo] Teixeira [presidente da CBF] é o homem para representar os interesses do futebol. Ele representa os interessas dele mesmo e de sua família. Esse país poderia realizar uma conferência com políticos das cidades que receberão a Copa para falar sobre o assunto. "O que nós realmente precisamos para fazer o Mundial? Nós não precisamos de mais estádios, para começar. Vamos usar os que já temos, não haverá um novo estádio para a Cerimônia de Abertura, não vamos gastar dinheiro com isso. Nós jogamos futebol o suficiente nesse país e a Copa são só mais 64 jogos".

Brasileiros não verão a Copa nos estádios

Eu tenho um conselho para os brasileiros que querem assistir à Copa do Mundo: comprem uma televisão maior. Se qualquer coisa sugeriu a vocês que o povo brasileiro vai conseguir entrar num estádio para ver um jogo do Mundial, acho que essa pessoa estava fumando alguma coisa estranha quando disse isso. Em Oslo, na Noruega, entrevistei um cara que trabalha no mercado negro de ingressos. Ele estava de saco cheio da Fifa e disse que cerca de 40% dos ingressos da Copa saem pela porta dos fundos da própria Fifa para o mercado negro. Como jornalista, adoro um número grande, mas nesse caso achei que ele estava exagerando. Aí comecei a pensar de onde podiam vir esses ingressos e vi que talvez ele estivesse certo. Porque na verdade esses ingressos são como barras de ouro, são muito valiosos, e não vão parar nas mãos de vocês, a não ser que estejam dispostos a pagar um valor muito maior do que o original. Eles são uma comoddity global, vendida para quem paga mais. O melhor jeito para vocês assistirem à Copa do Mundo é na televisão do vizinho.

Blatter é o Senhor Ninguém

Não precisamos de Ricardo Teixeira, Joseph Blatter e temo que da maioria dos africanos também. "Não haveria futebol sem Blatter". Oras! Por favor! Teríamos melhor futebol sem Joseph Blatter, porque todo o dinheiro iria para o desenvolvimento. Toda vez que você vê uma criança descalça jogando futebol, o que infelizmente vi na África, o Blatter está viajando por todo mundo em jatinhos privados. Ele não sabe nem o que são voos agendados. Quem diabos é esse homem? Ele é o Senhor Ninguém, mas em 1º de junho 186 pessoas votaram para ele continuar na presidência da Fifa e não havia alternativa. Metade deles é tola e metade é ladra, recebeu sua propina e seu ingresso para a Copa do Mundo.

Intervenção de Dilma

O Ricardo Teixeira tem controle sobre muitos parlamentares. Ele faz doações de campanha e isso é um problema. Mas para que serve o governo? Se o Brasil fosse invadido, o governo mandaria o exército para a rua, já que tem o dever de proteger o seu povo. E o governo brasileiro tem que proteger o povo brasileiro do Ricardo Teixeira. Se ele saísse, seria uma pessoa a menos para dar dinheiro para esses parlamentares, a Fifa não poderia fazer nada e o Brasil seria mundialmente aplaudido. O senhor Teixeira não é um problema só agora, ele vai continuar sendo um problema no futuro, porque o nome dele está envolvido em corrupção na Suíça. A presidente Dilma [Rousseff] deveria pedir a um de seus assessores para pegar o telefone e dizer: "Oi, Teixeira, corra para o escritório da presidente agora! Agora! Ela está te esperando e traga os documentos relacionados àquele caso na Suíça, ela quer vê-los". Isso provavelmente funcionaria, porque depois de ver o que tem nesses relatórios, ela teria que demiti-lo. Seria bom para o Brasil, vocês seriam beneficiados e poderiam colocar alguém limpo no lugar dele, além de mandar uma boa mensagem para o resto do mundo: "o Brasil não aceitará a porcaria da Fifa e de mais ninguém". É só dizer: "adeus, Teixeira". É dinheiro dos contribuintes, ele não é homem para ficar a cargo de dinheiro dos impostos.

Punição para Teixeira e Blatter

O mínimo que deveria acontecer com essas pessoas é serem banidas pela vida do futebol, e provavelmente mais algumas consequências criminais. É fácil se livrar dessas pessoas que não foram eleitas. O Teixeira pode ir brincar com seu amigo Sepp Blatter, mas não pode estar envolvido com o Comitê Organizador da Copa. Há gente o suficiente nesse país que sabe como organizar um torneio de futebol. O que ele sabe? Eles não sabem como construir um estádio, como agradar os fãs, como fazer os cachorros-quentes. Eles não sabem como comandar um jogo de futebol, então adeus Ricardo, adeus Tricky Ricky [Ricardo Trapaceiro, apelido dado pela imprensa inglesa ao presidente da CBF].

Copa de 2018 na Rússia

Isso prova como a corrupção está profunda na Fifa. Eu tenho que dizer: sou da Escócia, Inglaterra, e acho que a melhor opção para a Copa de 2018 era a candidatura de Bélgica e Holanda. Porque seria numa área pequena, os fãs poderiam ficar em um só hotel, eles têm trens muito bons para você ir e voltar dos jogos e a cerveja é excelente. A cerveja da Bélgica, uau! Se você é bebedor de cerveja, você vai para lá e nunca volta. Com certeza, os fãs iriam gostar disso. Para 2018, a Inglaterra estava bem, poderia fazer a Copa, mas acho que Bélgica e Holanda seriam perfeitas. Vamos finalizar: a Rússia não tem estádios, eles estão fazendo todo o tipo de promessa, o sistema ferroviário deles é horrível e o serviço de aviação não é seguro. Eles não estão prontos. Um dia talvez, mas agora não estão prontos.

Copa de 2022 no Catar?

Eles nunca deveriam ter realizado duas eleições ao mesmo tempo. Como você pode falar sobre 2022? Nós não temos ideia do que vai acontecer. Vai haver uma guerra até lá? Como vão ser os direitos de televisão? Nós não sabemos essas coisas. Aí aparece o Catar, um dos países mais ricos do mundo. Eles compraram a Copa, eles subornaram por isso. Mas ela não vai ser realizada, porque no mundo real do futebol os jogadores não irão. Se você dirige um dos grandes clubes da Europa, como Barcelona, Real Madrid, Chelsea, Manchester United ou Liverpool, você não vai mandar um par de pernas perfeito que custa 50 milhões de dólares para um lugar em que durante o dia sofrerão insolação. Eles dirão: "desculpe, você não terá meus jogadores". Aí, a Fifa vai começar a perceber que precisa levar os clubes europeus muito a sério, porque os jogadores vêm de lá. Talvez venham da Argentina e do Brasil, mas eles jogam em clubes europeus, que não ligam para a nacionalidade de suas estrelas e não as mandarão para uma coisa sem sentido. Eles falarão "não" e a Fifa terá que fazer algo.

* Fonte: gazetaesportiva.net

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