sábado, 2 de julho de 2011

DESVIOS A TODO VAPOR

"A tentativa de justificar a renúncia fiscal a ser arcada pelo contribuinte trabalhador para pagar centenas de milhões à construtora Odebrecht só engana os mais desatentos".
Aurélio Miguel, vereador paulistano, ganhador de medalhas olímpicas para o Brasil no judô
ILUSTRAÇÃO: AS MÃOS QUE AFANAM, LOGOMARCA DOS JOGOS

A todo vapor

Eduardo Alexandre

A FIFA é de impor, não de receber intimidações.

E foi assim que a Câmara de vereadores da cidade de São Paulo aprovou a concessão de incentivos fiscais para a construção do estádio do Corinthians, o Itaquerão, na zona leste: ou a entidade toda poderosa do futebol mundial aceita a condição de que a cidade sediará a abertura da Copa 2014 ou os incentivos não serão repassados para a empreiteira responsável pela obra, a Odebrecht.

Foi principalmente pelo atraso nas obras desse estádio que a FIFA das imposições cartoriais cedeu (e ela não é de concessões) a data do anúncio da escolha da sede da abertura, a divisão de grupos da primeira fase e a data de início da Copa, adiando em três meses, de julho para outubro deste 2011, essas definições, marcando pra valer o início de todas as obras, desde estádios, aeroportos, portos e infra-estruturas urbanas, mais as ditas de mobilidade.

O jogo da final, por ser presumidamente o de maior público, deve ser realizado no maior estádio, e este, no Brasil, deverá continuar sendo (se concluído) o Maracanã, no Rio de Janeiro, que, segundo pesquisa, também é o preferido do público para sediar a abertura dos jogos.

E fica a imposição para que a FIFA a resolva.

Cidade mais poderosa do país em se falando de finanças e contingente populacional, é certo que a mega-empresa de Blatter e Ricardo Teixeira já via São Paulo como a preferida para o jogo de abertura, quando o mundo pára para ver a festa, cidade a ganhar vitrine de divulgação massiça por longos meses e para a História. Mas daí a ter a trava na garganta, com a obrigação de digeri-la, é outra coisa.

E se outras sedes também se arvorarem de impor a mesma coisa, já que o véu de imposições da entidade máxima do futebol foi rasgado?

Brasília, por exemplo, por ser a capital do país, mesmo com estádio menor e população bem mais reduzida? Ou Porto Alegre ou Belo Horizonte, cidades de grande porte também?

Com certeza, vai ficar difícil para a FIFA decidir, apresentando justificativa plausível.

Cidades que obedeceram fielmente os cronogramas de obras preestabelecidos vão querer entrar na disputa, por que não?

Salvador, Recife, Fortaleza vão dizer que o Nordeste também merece atenção, por que essas cidades não podem ser contempladas?

E a guerra pelo jogo de abertura vai estar declarada, as cidades-sedes definitivamente inseridas nos jogos, agora já escaladas e irremediavelmente sem mais os riscos iniciais das chantagens que existiram.

Mas, pelo poder que representa, São Paulo vai mesmo ganhar a disputa, é evidente, e nada dessa guerra besta vai haver.

A FIFA vai ter a desculpa que precisa do Itaquerão para o brilhantismo dos jogos e nem o caráter de humilhação da exigência vai condoê-la, já que os cifrões de todas as rendas (direitos de transmissões, vendas de bugigangas e ingressos, comissões diversas, etc.) é o que mais interessa.

Vai, aliás, achar muito bom que a cláusula tenha sido inserida na lei que foi à sanção do prefeito Kassab, desautorizando os ciuminhos que as outras cidades esboçarem, talvez até antecipando para os próximos dias a decisão, já que outubro é longe e o tempo urge para tocar obras.

Depois disso, sim, a corrida para dar-se tudo pronto na data ainda não prevista começa de fato e o Brasil vai correr para concluir edificações que agigantar-se-ão em custos e apequenar-se-ão em qualidade, tudo fazendo para fugir do vexame que se anuncia e dos desvios do dinheiro público, estes sim, já desde o início a todo vapor.



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