sábado, 7 de maio de 2011

HEDIONDO CRIME DE LESA-PÁTRIA



TEREMOS OU NÃO O "LEGADO" PROMETIDO ?

Hoje, 26 de julho de 2009, faltando apenas 36 dias para a FIFA receber a licença ambiental relativa ao mega Empreendimento Imobiliário denominado simplesmente de "Arena das Dunas", o qual, sob promessa de tornar Natal uma das sub-sedes da copa mundial de futebol, e, em conseqüência deixar-lhe como legado a condição de uma cidade perfeita, feliz e livre de suas crônicas calamidades, corre a cidade o risco de perder o milagre, por terem sido gastos muitos meses com oba-oba, muita propaganda enganosa, muita festividade e não foram feitos os mínimos deveres elementares, como por exemplo, as audiências publicas de participação da população nas decisões, não cuidaram da escolha adequada do local, da elaboração dos projetos técnicos de praxe, e em conseqüência os cronogramas físicos-financeiros, a definição das parcerias, os valores e critérios da negociação, as garantias reais, enfim, toda a clareza e probidade obrigatórios no trato da coisa pública.

O que se viu foi uma trama feita em segredo, contratações suspeitamente ilegais de prestadores de serviços de consultorias e estudos preliminares arquitetônicos, como sempre alienígenas, sem qualquer reação das instituições representativas de economistas, arquitetos e engenheiros locais, alijados do mercado de trabalho, em flagrante demonstração de xenofilia e subserviência por parte de nossos gestores, já tendo sido gastos pelo erário perduláriamente, até este momento, ao que se sabe, importância acima de 3,6 milhões, entre pagamento de serviços, viagens e propaganda, e que, ainda poderão atingir à cifra acima de R$ 30 milhões só de contratos sem licitações, (provável custo dos honorários para serviços de arquitetura, urbanismo, paisagismo, projetos estruturais, instalações hidro-sanitárias, instalações elétricas, subestações, comunicação visual, iluminação, lógica, segurança, sonorização, etc., somente para a arena, de conformidade com as tabelas básicas dos respectivos especialistas, se efetivamente estiverem sendo feitos, pois até o momento continua tudo em segredo).

As importâncias acima estimadas ampliariam e manteriam nossos hospitais em excelente funcionamento, comprariam veículos e equipamentos para a polícia cuidar de nossa segurança, supririam tantas outras mazelas que nos afligem, e, enfim, se, num gesto de renuncia à megalomania de fazer irresponsavelmente e desnecessariamente, uma arena que custará muito mais do que um bilhão de reais, deixariam nossos gestores, independentemente de FIFA e CBF, verdadeiro legado de prosperidade e qualidade de vida para a população escarnecida de Natal.

Após o impacto causado pela reprovação unânime do local "escolhido" para o comentado empreendimento pela opinião de competentes e renomados especialistas nas áreas de trânsito e saneamento básico, por ocasião do Fórum de Discussão Técnica-Copa 2014, promovido pelo CREA-RN, no dia 03 do corrente, a obstinada fúria demolidora dos governantes mudou de estratégia, isto é, passou a se referir discretamente apenas a licenças para um simples estádio de de futebol (até porque ali já existe o Machadão), visível artifício no sentido de subdimensionar o impacto degradador do meio ambiente como do impacto de trânsito.

É claro que as licenças resultantes desse ardil não conseguirão ludibriar nem à área técnica nem às defensorias públicas, até porque é notória a procrastinação dos processos de licenciamento na SEMURB, até para um pequeno prédio sem nenhuma expressão, quiçá para uma cidade de mais de 130.000 habitantes em um quarteirão de 46 hectares em cima de uma lagoa, ter que "improvisar" licenças, urbanísticas, arquitetônicas e ambientais em pouco mais de 30 dias.

Ademais, tem-se que levar em conta que já esgotaram-se os prazos para cumprimento dos ritos legais previstos nas normas ambientais e nas normas jurídicas de alienação de bens públicos, tais como audiências públicas de debates, prazos de publicação e manifestação da sociedade, consentimento dos poderes legislativos, etc.

Assim sendo, no nosso entendimento, qualquer licenciamento para um empreendimento desse porte, na dimensão anunciada na propaganda oficial, terá no mínimo que ser diagnosticado e apresentar soluções mitigadoras, atendendo os seguintes critérios, a serem fundamentados em avaliações de profissionais legalmente habilitados e de comprovada idoneidade:

I – Qual o valor da gleba?;

II - Qual o valor dos prédios existentes?;

III – Qual o valor dos projetos, consultorias e despesas legais, e quem paga?

IV – Qual o método de demolição das edificações existentes, seu volume, qual o custo e quem paga?;

V – Qual o custo de transporte do entulho pesado (bota-fora) resultante das demolições, aonde despejá-lo, e quem paga?;

VI – Qual a área construída coberta do estádio ("arena" - população flutuante fixada = 45.000 pessoas), qual seu custo, e quem paga?;

VII – Qual a área construída coberta do shopping center? Qual sua freqüência de público p/jornada? Qual a quantidade de vagas de estacionamento rotativo p/jornada, qual seu custo e quem paga?;

VII – Qual a área de construção coberta do centro de convenções, da arena multiuso, dos prédios comerciais e dos edifícios residenciais, definindo sua condição condominial, quantificando estacionamentos privados, se for o caso, ainda, definindo áreas de hotéis, quantidade de leitos, estacionamentos, população final de todo o conjunto, quais os custos e quem paga?;

VIII – Quais as áreas de construção coberta dos centros administrativos previstos para o Estado e para o Município, qual a quantidade total de ocupantes por expediente funcional entre funcionários e público visitante (contribuintes), condições de estacionamento, e, qual será o valor locativo do uso do seu próprio solo que pagarão os erários estaduais e municipais, durante 30 anos?;

IX – Qual será o novo projeto de sistematização viária e respectivo sistema de trânsito e mobilidade exigidos pelo evento, quais as intervenções, seus custos, prazos e fontes de recursos ? X – Aonde a máquina administrativa será alojada durante o período de execução do projeto, por quanto tempo, e quanto custará ao erário sua manutenção, e qual a garantia de sua eficiência?; XI – Qual o projeto emergencial que suportará o enorme impacto ambiental e de vizinhança, resultante das demolições e transporte dos entulhos e do canteiro de obras, e durante qual período (tais como poeira, ruídos, movimento de máquinas pesadas, usinagem, terraplanagem, congestionamento de trânsito), afetando as duas maiores artérias da estrutura urbana da cidade, quanto custará, e, a quem caberá pagar?;

XII – Por ultimo, tem que ser apurada a população final que ocupará o espaço, a densidade demográfica resultante, e o efluente final de esgoto primário, qual seu sistema de tratamento e despejo, qual o sistema de drenagem, bem como é imperioso a quantificação e solução do impacto de trânsito causado pelo grande aumento de veículos que irão circular na área, já hoje seriamente congestionada.

Face ao exposto, diante do segredo que vem revestindo o assunto, com apoio em algumas pesquisas expeditas, nos foi possível formular algumas simulações conclusivas, até prova em contrário, senão vejamos:

1 - Somando-se as populações do estádio de 45.000 pessoas p/evento, mais a freqüência diária de 70.000 pessoas p/jornada de 12 horas (referência Midway Mall), mais centro de convenções, arena de multiuso, hotéis, prédios comerciais, residenciais e centros administrativos, pode-se prever uma ocupação mínima de 130.000 pessoas na área em questão, num determinado momento de pico, significando uma exagerada densidade demográfica de 2.826 ocupantes ou habitantes por hectare bruto, a qual ultrapassa em 62% ao permitido pelo Plano Diretor da cidade (1.750 hab/há bruto, correspondente ao índice de aproveitamento de 3,5)

2 – Por outro lado, considerando-se ainda o estacionamento rotativo de 14.000 veículos p/jornada (referência Midway Mall), e informações da propaganda oficial de 7.200 veículos previstos no projeto ainda virtual, pode-se adotar um total de 14.000 veículos, uma vez que as unidades vendidas em condomínios fechados, exigem estacionamentos privativos por motivos óbvios, representando um índice de impermeabilização da lagoa de 308.000 m2: considerando- se ainda uma estimativa de 20% da área da gleba para sistema viário interno de acesso e travessia, teríamos um total de área de obstrução ao sistema de drenagem e realimentação do lençol de cerca de 400.000 m2, representando um percentual de permeabilidade de apenas 13%, portanto, menor do que o índice exigido pelo Plano Diretor da cidade;

3 – Se for feita a avaliação do custo-benefício da transação pretendida por meio de uma PPP ainda nebulosa e indefinida, com base apenas nas eufóricas declarações dos representantes governamentais, o patrimônio público que estão querendo demolir, que ao nosso ver vale no mínimo R$ 1 bilhão, poderá deixar como legado um prejuízo material inconcebível conforme se pode perceber: o Município concorda filantropicamente em demolir o Machadão, sob promessa de que o PP (Parceiro Privado, quantos e quais são ?) construirá outro estádio no seu lugar, assim, trocará SEIS por MEIA DÚZIA, destrói o Ginásio Humberto Nesi , perde um ginásio, não ganha nada, dizem que vai ganhar um Centro Administrativo, mas vai pagar 30 anos de aluguel por ele, ou melhor, vai pagá-lo em 360 prestações que ninguém sabe de quanto, dando de presente 17 hectares de terreno altamente valorizado para o parceiro se locupletar e agredir a cidade, enfim, saldo negativo, igual a presente de grego.

Quanto ao Estado, na mesma linha filantrópica, desmancha o Centro Administrativo, o Kartódromo, o Altar do Papa João Paulo II, uma creche e um grupo escolar, presenteia o Parceiro Privado com um terreno de 29 hectares no coração da cidade, para completar a agressão, sob promessa de receber como compensação um novo Centro Administrativo, para pagá-lo também em 360 prestações, de valor igualmente desconhecido, resultando em outro saldo negativo, igual a outro Cavalo de Tróia.

Quanto às perdas irrecuperáveis de caráter estimativo, de valor histórico, cultural, arquitetônico e religioso, são bens irrenunciáveis, imensuráveis, cuja avaliação depende de sensibilidade e padrões éticos. Inerentes a cada povo e cada cultura. Não tem valor material, mas seus causadores cometem o crime hediondo de lesa-pátria.


Moacyr Gomes da Costa

Arquiteto – N° 7473/D – CREA/RJ

Reg. Nacional Nº 200288655-5

Natal/RN, 26 de julho de 2009


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